CRÍTICA
DE ARIANO SUASSUNA SOBRE O FORRÓ ATUAL (Texto de José Teles)
"Tem
rapariga aí? Se tem levante a mão!". A maioria, as moças, levanta a mão.
Diante
de uma platéia de milhares de pessoas, quase todas muito jovens, pelo menos um
terço de adolescentes, o vocalista da banda que se diz de forró utiliza uma de
suas palavras prediletas (dele só não, e todas bandas do gênero). As outras são
'gaia', 'cabaré', e bebida em geral, com ênfase na cachaça. Esta cena aconteceu
no ano passado, numa das cidades de destaque do agreste (mas se repete em
qualquer uma onde estas bandas se apresentam). Nos anos 70, e provavelmente
ainda nos anos 80, o vocalista teria dificuldades em deixar a cidade.
O
secretário de cultura Ariano Suassuna foi bastante criticado, numa
aula-espetáculo, no ano passado, por ter malhado uma música da Banda Calipso,
que ele achava (deve continuar achando, claro) de mau gosto.
Vai
daí que mostraram a ele algumas letras das bandas de 'forró', e Ariano
exclamou: 'Eita que é pior do que eu pensava'. Do que ele, e muito mais gente
jamais imaginou.
Para
uma matéria que escrevi no São João passado baixei algumas músicas bem
representativas destas bandas. Não vou nem citar letras, porque este jornal é
visto por leitores virtuais de família. Mas me arrisco a dizer alguns títulos,
vamos lá: Calcinha no chão (Caviar com Rapadura), Zé Priquito (Duquinha), Fiel
à putaria (Felipão Forró Moral), Chefe do puteiro (Aviões do forró), Mulher
roleira (Saia Rodada), Mulher roleira a resposta (Forró Real), Chico Rola
(Bonde do Forró), Banho de língua (Solteirões do Forró), Vou dá-lhe de cano de
ferro (Forró Chacal), Dinheiro na mão, calcinha no chão (Saia Rodada), Sou
viciado em putaria (Ferro na Boneca), Abre as pernas e dê uma sentadinha
(Gaviões do forró), Tapa na cara, puxão no cabelo (Swing do forró). Esta é uma
pequeníssima lista do repertório das bandas.
Porém
o culpado desta 'desculhambação' não é culpa exatamente das bandas, ou dos
empresários que as financiam, já que na grande parte delas, cantores, músicos e
bailarinos são meros empregados do cara que investe no grupo. O buraco é mais
embaixo. E aí faço um paralelo com o turbo folk, um subgênero musical que
surgiu na antiga Iugoslávia, quando o país estava esfacelando-se. Dilacerado
por guerras étnicas, em pleno governo do tresloucado Slobodan Milosevic surgiu
o turbo folk, mistura de pop, com música regional sérvia e oriental. As
estrelas da turbo folk vestiam-se como se vestem as vocalistas das bandas de
'forró', parafraseando Luiz Gonzaga, as blusas terminavam muito cedo, as saias
e shortes começavam muito tarde. Numa entrevista ao jornal inglês The Guardian,
o diretor do Centro de Estudos alternativos de Belgrado. Milan Nikolic,
afirmou, em 2003, que o regime Milosevic incentivou uma música que destruiu o
bom-gosto e relevou o primitivismo estético. Pior, o glamour, a facilidade
estética, pegou em cheio uma juventude que perdeu a crença nos políticos, nos
valores morais de uma sociedade dominada pela máfia, que, por sua vez, dominava
o governo.
Aqui
o que se autodenomina 'forró estilizado' continua de vento em popa. Tomou o
lugar do forró autêntico nos principais arraiais juninos do Nordeste. Sem falso
moralismo, nem elitismo, um fenômeno lamentável, e merecedor de maior atenção.
Quando um vocalista de uma banda de música popular, em plena praça pública, de
uma grande cidade, com presença de autoridades competentes (e suas respectivas
patroas) pergunta se tem 'rapariga na platéia', alguma coisa está fora de
ordem. Quando canta uma canção (canção?!!!) que tem como tema uma transa de uma
moça com dois rapazes (ao mesmo tempo), e o refrão é 'É vou dá-lhe de cano de
ferro/e toma cano de ferro!', alguma coisa está muito doente. Sem esquecer que
uma juventude cuja cabeça é feita por tal tipo de música é a que vai tomar as
rédeas do poder daqui a alguns poucos anos.
Realmente,
alguma coisa está muito errada com esse nosso país, quando se levanta a mão pra
se vangloriar que é rapariga, cachorra, raparigueiro, cachaceiro, que gosta de
puteiro, aonde vamos parar? como podemos querer pessoas sérias, competentes? e
não pensem que uma coisa não tem a ver com a outra não, porque tem e muito! E
como as mulheres querem respeito como havia antigamente? Se hoje elas pedem
'ferro', 'quero logo 3', 'lapada na rachada'? Os homens vão e atendem. Vamos
passar essa mensagem adiante, as pessoas não podem continuar gritando e
vibrando por serem putas e raparigueiros não. Reflitam bem sobre isso, eu sei
que gosto é gosto... Mas, pensem direitinho se querem continuar gostando desse
tipo de 'forró' ou qualquer outro tipo de ruído, ou se querem ser alguém de
respeito na vida!
Fonte: entre fotos e versos
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