Navegando na net em busca de conteúdo pra postar aqui no Mural, tenho percebido que um certo assunto tem aparecido com freqüência: Igreja Emergente. Há até sites e blogs específicos que tratam dela. O Gonzaga até postou algo aqui recentemente relacionado a ela (clique aqui pra ver).
O assunto igreja emergente não é algo novo, pois parece que é uma idéia/movimento surgido lá no começo anos 90 do século passado.
Visando clarear nossas mentes em relação ao tema - mostrar os "prós e contras", "defensores e opositores", dar subsídios pros leitores do Mural julgarem se é algo válido e que merece especial atenção ou se é apenas um rótulo, modismo -, vamos publicar periodicamente aqui textos sobre ela, a igreja emergente. Começamos com esse texto abaixo que conceitua essa tal igreja.
Afinal de contas, o que é a igreja emergente? Tentar definir “igreja emergente” não é uma tarefa fácil. Os contextos em que a definição pode ser lida são muitos, cada um deles com seus desafios. Escrevo esperando não limitar o que a igreja emergente possa vir a ser.
Igrejas emergentes são comunidades que praticam o modo de vida de Jesus na cultura brasileira. [1]
Três práticas que caracterizam igrejas emergentes são:
1- Identificação com Jesus. Igrejas emergentes são cristocêntricas. Basicamente, valorizam-se as palavras e a vida de Jesus descritas nos Evangelhos. Jesus é visto como uma pessoa participante na cultura. Formou uma comunidade deixando o exemplo. Em vez da ênfase na experiência individual com Cristo, o crente é convidado a seguir o exemplo de Jesus incluindo os excluídos, desafiando autoridades políticas e religiosas, e vivendo humildemente em comunidades alternativas. Jesus não quis ser servido, mas servir. Vez após vez Jesus nega receber prestígio, riquezas ou buscar interesse próprio. [2] O crente é chamado a confrontar a hipocrisia e a ganância de poder e dinheiro dos líderes políticos e religiosos. A boa notícia do evangelho não é tanto que Jesus morreu para perdoar os pecados mas que Deus veio ao mundo e somos todos convidados a participar com ele em uma nova vida na redenção do mundo. A igreja emergente não tem a ver com formas de igreja, mas com a boa notícia do Reino de Deus.
2- Transformação da realidade secular. Para igrejas emergentes não há divisão entre “santo” (sagrado) e “do mundo” (secular). A contradição na divisão entre coisas “santas” e “do mundo” está no fato de a esfera “do mundo” afirmar um espaço possível sem Deus. Igrejas emergentes reconhecem a Missio Dei – o trabalho de Deus – em lugares ou atividades antes tidos como não espirituais. No pós-modernismo, as pessoas desconstróem dualismos falsos como o natural contra o supernatural, corpo contra mente e espírito, ou fé contra razão. A vida é um todo. A vida espiritual não está desassociada da arte, música, economia e política. Assim como Jesus se encarnou e viveu no mundo, o crente é chamado a viver na cultura brasileira. Os crentes não se definem nem são estigmatizados por pertencerem a uma sub-cultura cristã (evangélica, católica, ou outra), mas participam natural e ativamente na cultura brasileira.
3- Vida em comunidade. Jesus não escreveu livros, mas criou uma comunidade pequena. A trindade é uma comunidade. Os relacionamentos são enfatizados. Igrejas emergentes desafiam a prioridade do indivíduo. O Reino de Deus é demonstrado na prática na vida da comunidade e o culto passa a ter menos importância.[3] Igrejas emergentes vêem o Reino praticamente como uma desconstrução das práticas de igreja comuns hoje. Para elas do Reino deriva a igreja, e não o contrário. Igrejas emergentes são mais como famílias do que como instituições.[4] São comunidades descentralizadas. São mais pessoas do que lugares. São mais comunidades do que cultos. Contudo, pessoas prestam contas de uma forma ou de outra a outras pessoas.[5] Não gostam muito de programas e ministérios, mas suas atividades nascem espontaneamente dos valores e estilos de vida entre os amigos.[6] Em vez de a igreja ensinar como indivíduos podem “se dar bem” aplicando a Lei de Gérson, pessoas são desafiadas a conviverem e cooperarem em codependência[7]. Nestas comunidades os mais fracos e vulneráveis são acolhidos, incluidos, recebidos.
Dessas três práticas derivam outras:
1- Recebendo os de fora (isto é, os excluídos, os diferentes, o estranho). Jesus constantemente incluiu os excluídos do seu tempo. Não era mais preciso seguir regras de conduta para estar dentro ou fora da comunidade de Jesus. Os pobres, os aleijados, os coxos e os cegos são convidados. Igrejas emergentes deliberadamente buscam incluir os que são “diferentes”. Evangelismo, portanto, é repensado; deixa de ser proselitista para humildemente caminhar, demonstrar e conviver com o “outro”. Em vez de arrogantes são transparentes e humildes. Em vez de todos procurarem ser chefes, procuram ser servos. Jesus é visto no outro e na outra[8]. Jesus é visto nos injustiçados e esquecidos da sociedade. Ao longo da caminhada mantém-se o respeito ao “outro”.[9]
2- Servindo com generosidade. Em vez da Grande Omissão, a Grande Comissão: ide. Assim como Jesus não veio ser servido mas servir, assim também a igreja é convidada a servir. Isto inclui desde os desafios do bairro onde está a comunidade até os desafios globais. Igrejas emergentes evitam ver o serviço como um pé na porta para evangelização. Serviço é uma expressão do amor de Cristo. O dízimo não é para a igreja mas da igreja. Finalmente, o serviço não acontece necessariamente na igreja, mas pessoas podem servir através de suas vocações ou profissões.
3- Participando como produtores. Criando com arte. Todos podem participar na redenção do mundo. No culto, por exemplo, trazemos todo o nosso ser a Deus. Trazemos nosso mundo, nossa realidade, incluindo nossas dúvidas e nossos fracassos. O culto é celebração criativa, mas não é um escape da vida e da realidade. Em vez de consumidoras de culto, pessoas participam como produtoras. Todos são convidados a criarem arte no culto, pois de outra forma o culto tende a tornar-se elitista[10]. A arte e a cultura são importantes na liturgia. O meio é a mensagem. [11] A utilização de elementos e símbolos da cultura popular brasileira são muito importantes.
4- Liderando como corpo. Não há patriarcas no Reino. Jesus é a cabeça da comunidade. A natureza do Reino de Deus nos leva a reexaminar todos os conceitos de poder. A modernização da igreja acabou gerando uma liderança associada a poder, controle, coerção e submissão à autoridade. Nas igrejas emergentes, busca-se um modelo de liderança que utiliza mais a sugestão e o exemplo do que o poder. Ao invés de hierarquias, redes. Ao invés da visão do líder, a visão de todos. Ao invés de cargo, considera-se influência, exemplo e histórico. Em vez de “mediarem Deus”, líderes ajudam todos em seus ministérios. Em vez de métodos centralizados e de controle, métodos relacionais e descentralizados. Em vez de gerentes, preferem-se conselheiros e visionários. Em vez de líderes carismáticos, líderes participantes. Em vez do líder de sucesso, o líder humilde. Em vez do senhor de engenho, o escravo de Cristo. Em vez de discursos, demonstração por exemplo. No Reino são os servos que decidem, e não a elite poderosa. Dá-se voz aos que não têm voz. Bons líderes emergentes buscam genuinamente o bem de todos e não o de alguns poucos.
[1] Várias idéias desse texto vêm do livro “Emerging Churches: Creating Christian Community in Postmodern Cultures”, Gibbs & Bolger.
[2] Ao contrário do que promove a Teologia da Prosperidade, o crente é chamado a imitar Jesus buscando em primeiro lugar o Reino de Deus e a sua justiça. É chamado a amar o próximo como a si mesmo, lembrando-se da parábola do Bom Samaritano.
[3] Ou um dos objetivos do culto passa a ser a capacitação do crente e a edificação mútua para servir no mundo.
[4] Por isso podemos pensar em igrejas que nascem nos relacionamentos comuns entre pessoas. Podemos imaginar igrejas-lavanderias, igrejas-da-turma-do-bairro, igrejas-dos-skatistas-da-quadra-x, igrejas-dos-amigos-do-bar-y, igrejas-dos-sem-igrejas, etc.
[5] Não tenho problemas em considerar amigos em um bar uma igreja. É necessário, contudo, haver compromisso mútuo e ciência da missão de Deus.
[6] Não que igrejas emergentes sejam incompatíveis com formas de igrejas históricas. “Igrejas históricas” ou “institucionais” são convidadas a repensarem valores e prioridades, e a participarem da conversa emergente.
[7] Ricos, pobres, pessoas assim e assado.
[8] Ver Mateus 25.
[9] Incluindo aqueles que crêem diferente de nós. Incluindo crentes que gostam muito das coisas como estão.
[10] Todos, independente de nível de educação, local de origem ou status social.
[11] Isto é, coisas não faladas podem falar alto, como a arquitetura do templo, objetos no templo, roupas, etc.
Fonte: Gustavo Frederico em http://emergente.pbwiki.com
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